Todos os dias a imprensa registra os números de acidentes de trânsito com vítimas fatais no País. Especialmente nas segundas-feiras, os noticiários de TV em todo Brasil publicam estatísticas, comentam os números e os fatos se repetem.
No mundo, cerca de 1,3 milhão de pessoas morrem vítimas de acidentes de trânsito por ano, mais de 50 milhões ficam feridas e o gasto com saúde pública para esses casos é de aproximadamente 100 bilhões de dólares. No Brasil, são 60 mil mortes anualmente, embora a estimativa seja o dobro, em virtude de só serem consideradas para fins de estatísticas as vítimas que morrem no local do acidente. As despesas médico-hospitalares, previdenciárias, entre outras aqui em nosso País são de R$ 40 bilhões.
Os mortos na maioria são jovens, homens, perderam a vida nos finais de semana e, no geral, beberam, e beberam muito. Essa realidade faz parte de um fenômeno mundial, ao ponto de ser pauta de fóruns internacionais e resoluções da Organização Mundial Saúde, muitas das quais somos signatários.
Nos últimos dias, após relatório da OMS evidenciando que o álcool mata mais que aids, tuberculose e violência, editoriais de grandes jornais de circulação nacional se debruçaram sobre as causas dos acidentes, chamando a atenção da sociedade e dos governos, mas estranhamente ignoraram as ações que, segundo o documento recente, poderiam reduzir essa trágica realidade.
Na avaliação de especialistas do mundo inteiro, que pensaram políticas para enfrentar esse quadro, o baixo custo da bebida aliada à publicidade excessiva, especialmente voltada para o público jovem, é a principal causa das mortes. Sugerem medidas, como aumentar a tributação da cerveja e proibir a propaganda da bebida. O Brasil, diante de um silêncio hipócrita consentido, caminha no sentido contrário.
A guerra publicitária das cervejas movimenta milhões. A qualquer tentativa de regular a matéria as grandes agências de publicidade invadem o Salão Verde do Congresso Nacional, e cantores, atores, esportistas, todos “especialistas“ na matéria convencem a todos que só no Brasil não há relação direta entre propaganda de cerveja e mortes de jovens no trânsito.
Dessa forma, assistimos ao crescimento do número de mortes, do mercado da cerveja e da publicidade dessa bebida pela televisão e em horário nobre, culpando autoridades, mas ignorando as responsabilidades das grandes empresas de cerveja e o mercado da propaganda.
O Conselho de Autorregulamentação Publicitária (Conar), timidamente, orienta para que não se vincule a publicidade das cervejas a esporte, carros, mulheres, sinal de maturidade etc. Algumas marcas fazem associação direta de seu produto com mulheres insinuantes, atividades esportivas – como o futebol – e exploram, ao máximo, ambientes sociais, como praias e rodas de churrasco.
O Congresso não pautará essa matéria se não for pressionado pela sociedade, que por sua vez depende da mídia para se fazer ouvir. Cobrem do Parlamento a aprovação de uma medida que proíba a publicidade de cerveja no Brasil durante 180 dias e, se o número de mortes não reduzir em mais de 30%, nunca mais falo nesse assunto. Tenham a mesma coragem que tiveram com o cigarro, que teve restringida sua publicidade por lei, e mostrem estatísticas pós esse período que nos encham de orgulho, e exijam do Congresso e do governo uma lei que ajude a por fim à carnificina de jovens no trânsito.
*Paulo Pimenta
Deputado federal (PT-RS)
dep.paulopimenta@camara.gov.br
Originalmente publicado no site Gazeta do Sul em 02/03/2011.
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