por Archimedes Azevedo Raia Jr.*
A Câmara Temática de Engenharia de Tráfego, da Sinalização e da Via, do Conselho Nacional de Trânsito elaborou duas minutas de Resolução com o objetivo de atualizar as normas para implantação de ondulações transversais e sonorizadores em vias públicas, atualmente regulamentada pela Resolução 39/1998.
A proposta está disponível no site do Denatran para que se apresentem sugestões para o aprimoramento da Resolução.
Não se trata de criticar a ação de atualização na norma por parte do Contran. Ela é válida e traz aspectos bastante positivos. Este é o caso do Art. 1, que reza: “É proibida a utilização de tachas, tachões e dispositivos similares aplicados transversalmente à via pública.“ Estes elementos são absurdos, do ponto de vista de geometria e, apesar disso, são colocados de forma irresponsável pelas autoridades de trânsito nas cidades. Outro aspecto importante, é que a lombada do tipo I não pode ser colocada em vias onde circulam o transporte coletivo (Art. 4). Também propõe punições para quem instalar estes dispositivos à revelia da autoridade de trânsito (Art. 12).
O tratamento deste tema não é recente. Em 1984, ainda sob a égide do Código de 1966, a Companhia de Engenharia de Tráfego de São Paulo publicava uma Norma Técnica, n. 84, que apresentava alternativas de métodos construtivos de lombadas, tendo em vista um modo rápido e preciso de implantação desses dispositivos.
Do ponto de vista da Engenharia de Tráfego, a implantação desses obstáculos mais se configura como uma excrescência, em seu sentido literal, ao funcionamento do fluxo de trânsito. Ora, a função da Engenharia de Tráfego é promover o desenvolvimento de um trânsito seguro, fluido e confortável para os diversos usuários do sistema.
Há que se lembrar que o obstáculo, com uso disseminado em todo o território nacional, é parte de uma filosofia, denominada traffic calming, muitas vezes traduzida como moderação de tráfego. Esta tradução, pode-se dizer, é equivocada, pois seu conceito é muito mais abrangente e traz resultados muito positivos em boa parte do mundo desenvolvido.
Diferentemente do que acontece no Brasil, o uso destes dispositivos em traffic calming é acompanhado por uma série de outras providências, inclusive com ações que incentivam o uso de modos não motorizados, visando maior sustentabilidade.
Em geral, os pavimentos de cidades brasileiras são esburacados, com calombos, muitos defeitos, etc. A população, normalmente, reclama da qualidade do piso e as prefeituras montam equipes específicas e gastam milhares de reais com operações tapa-buracos.
Mas, pensando na segurança de trânsito em locais pontuais, são implantados dispositivos de redução de velocidade que impõem literalmente obstáculos aos fluxos, justamente aquilo que não se gostaria que não existissem nas vias.
Veículos de emergência e socorro, tais como viaturas policiais, bombeiros, SAMU, ambulâncias, encontram dificuldades com estes dispositivos, justamente em momentos onde a rapidez do atendimento é fundamental.
Aos ônibus urbanos, que são veículos pesados e que transportam dezenas de pessoas, além do desconforto para os passageiros, são imputados vários problemas: redução na velocidade comercial, gastos adicionais de sistemas de freios, aumento no consumo de combustíveis e lubrificantes, desgaste nos sistemas de suspensão, maior emissão de poluentes, etc.
É de domínio popular que as famigeradas lombadas, ou redutores, ou ainda “guardas deitados“, dentre outras denominações, devam ser construídas sempre em frente ao imóvel do vizinho, nunca frontais às suas próprias casas. As lombadas, devido às constantes frenagens, principalmente de veículos pesados – ônibus e caminhões – provocam impactos no solo, que além do desconforto aos moradores, causam rachaduras nas paredes e estruturas dos imóveis lindeiros aos dispositivos.
O obstáculo físico, não obstante, não impede que motociclistas ou condutores de automóveis transponham essas elevações com velocidades superiores àquela regulamentada na via, colocando em risco a segurança no local, principalmente, para aqueles que desconhecem a região, sobretudo à noite ou em dias de chuva.
Devido à proliferação na implantação destes dispositivos, as prefeituras não possuem condições de mantê-los devidamente sinalizados, como manda a norma e, via de regra, causam surpresas e situações de perigos a muitos.
Os órgãos gestores do trânsito se deparam, no dia a dia, com enormes dificuldades para a manutenção de um pavimento que seja plano, liso, e claro, obedecendo aos critérios construtivos da pavimentação viária. A presença de saliências ou depressões no pavimento gera desconforto, insegurança, danos aos veículos, aos usuários, com um todo.
Estudos feitos pelo NEESTS-Núcleo de Estudos em Engenharia e Segurança de Tráfego Sustentável da Universidade Federal de São Carlos, considerando algumas cidades, apontaram que grande parte dos obstáculos implantados estava em desacordo com as normas, quer seja no aspecto construtivo (geometria), quer seja na topografia, na sinalização ou na localização. Alguns casos se configuraram como verdadeiras arapucas aos condutores.
Não se está aqui defendendo os condutores irresponsáveis e incivilizados, que tem por prática desrespeitar as velocidades de segurança, estabelecidas pelas autoridades de trânsito ou mesmo aquelas definidas pelo Código de Trânsito Brasileiro, para vias não sinalizadas.
No entanto, a tecnologia disponível em dias atuais dispõe de equipamentos modernos, que não impõe ao usuário os inconvenientes provocados pelas barreiras físicas. Trata-se das chamadas lombadas eletrônicas, que garantem a circulação dos veículos em velocidades regulamentadas para o local, além de funcionar com o caráter pedagógico, mostrando ao motorista a sua velocidade.
O mundo se move, atualmente, com níveis incríveis de sofisticação tecnológica, nos mais variados campos. No entanto, o trânsito, particularmente no Brasil, que é um elemento essencial no cotidiano das pessoas, trabalha, ainda, sem se beneficiar dessas novas tecnologias.
Sistemas de Transportes Inteligentes, que é o nome que se dá ao uso de modernas tecnologias na operação e controle dos sistemas de transportes, precisam ser incorporados nos manuais de práticas de Engenharia de Tráfego dos gestores brasileiros de trânsito. Afinal, o Brasil é hoje a sexta maior economia do mundo, porém, tem um trânsito de terceiro mundo.
*Prof. Dr. Archimedes Azevedo Raia Jr.
Engenheiro, mestre e doutor em transportes pela USP, coordenador do Núcleo de Estudos em Engenharia e Segurança de Tráfego Sustentável, professor da UFSCar e co-autor do livro “Segurança no Trânsito”, Ed. São Francisco. E-mail: raiajr@ufscar.br
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