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“Não existe uma solução única: tem que usar todas as modalidades possíveis, até as não motorizadas”

Técnico do Ipea analisa como a mobilidade se tornou uma das principais questões das agendas dos gestores públicos

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Com base na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD), o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) descobriu que 47% dos domicílios brasileiros têm automóvel ou motocicleta. Por um lado, este dado mostra uma alta taxa de motorização. Por outro, mais da metade dos domicílios ainda não tem veículo, e essas famílias estão tendo cada vez mais acesso, e a passos rápidos. O técnico de planejamento e pesquisa da entidade, Carlos Henrique Ribeiro de Carvalho, analisa a situação atual da gestão de transportes no Brasil e aponta os novos rumos do mercado automobilístico no País.

Perkons – Qual é o transporte preferido dos brasileiros quando a meta é poupar tempo?
Carlos Henrique
Nas residências com motocicleta e automóvel, o tempo de deslocamento é muito inferior que nas outras. Daí se deduz que as pessoas que usam transporte público levam mais tempo para se deslocar. Isso porque não há priorização do transporte coletivo. Apenas recentemente é que estão surgindo projetos de corredores exclusivos de ônibus e outras tentativas. Com esses projetos, a tendência é que esse tempo de trajeto diminua nos meios coletivos de transporte. Porém muitos brasileiros ainda apostam nos veículos privados, em especial a moto. A frota de automóveis cresce 9% ao ano no Brasil, sendo que e a de motocicletas cresce 19%. Quanto mais congestionamentos, mais as motocicletas se beneficiam. O problema desse veículo é a frequência e a gravidade de acidentes, além da poluição: polui muito mais que qualquer outro veículo. Quanto aos acidentes, para se ter uma ideia, hoje morre a mesma quantidade de pessoas em automóveis e motocicletas, sendo que a frota de motos representa um terço da de carros.

PK – Qual é a alternativa de transporte ideal para os brasileiros?
CH –
Considerando que 40 mil pessoas morrem anualmente em acidentes de trânsito no Brasil, gerando um custo de 30 bilhões de reais para o setores públicos e privados, eu diria que o transporte público ainda é o mais indicado. Para se ter uma ideia, o investimento previsto no PAC da Copa, a ser realizado entre 2010 e 2014 nas cidades-sede, chega a cerca de R$ 10 bilhões. Se 10% dos usuários de transporte individual migrarem para o transporte público, a tendência é reduzir muito essas 40 mil mortes por ano, isso sem falar no impacto ambiental positivo que isso causaria. Hoje um usuário de automóvel polui mais que dez vezes o que polui um usuário de transporte público. De acordo com estudos da Universidade de São Paulo (USP), morrem por ano em torno de 4 mil pessoas por problemas causados pela poluição do ar só na capital paulista.


“O suprimento a esta demanda não precisa ser um problema: o ponto central está nas formas de uso, e não de propriedade”, aponta Carlos Henrique Ribeiro de Carvalho, técnico de planejamento e pesquisa do Ipea.

PK – Como priorizar o transporte coletivo sem necessariamente prejudicar o crescimento da economia, alavancado pela venda de carros zero quilômetro?
CH
– A indústria automobilística é forte. As políticas de transporte não precisam ir contra esse setor. Exemplo disso é que a Fiat anunciou que vai construir uma fábrica em Pernambuco para produzir 200 mil veículos a custos mais baixos, focados no mercado do Nordeste, onde ainda predomina a baixa renda. Em Alagoas, por exemplo, apenas 26% dos domicílios têm veículo. O atendimento a essa demanda reprimida acontece porque melhorou a renda. A indústria automobilística já percebe isso, e vê aí uma possibilidade de crescimento. O suprimento a esta demanda não precisa ser um problema: o ponto central está nas formas de uso, e não de propriedade. Ao invés de ir contra o acesso ao automóvel, cabem as políticas mitigadoras do sistema: investir em transporte público para que – mesmo que a pessoa tenha carro – ela use rotineiramente o transporte coletivo; restrição de circulação de transportes individuais, pelo menos no horário do rush, entre outras ações. Lembrando que, ao restringir, tem que dar alternativa, que é o próprio transporte público, inclusive com intermodais (carro, ônibus, trens, etc). Não existe uma solução única: tem que usar todas as modalidades possíveis, até as não motorizadas, e integradas entre si. Até mesmo o automóvel: ele também faz parte dessa engrenagem (em determinadas áreas é o melhor meio), mas o uso precisa ser racional e otimizado.

PK – Você acredita que os governos já estão vendo o trânsito como uma questão fundamental e estratégica na gestão pública?
CH
Acho que, de certa forma, já há uma conscientização geral entre os gestores públicos da problemática da mobilidade. Está na agenda de todos os gestores públicos, sendo que antes não fazia parte dessa agenda. Condições de mobilidade afetam diretamente a economia da cidade. Quanto pior é, mais impactos econômicos e sociais. O Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) é um exemplo disso: colocou a mobilidade em primeiro plano. O problema é que, mesmo com essa conscientização, mesmo tendo avanços nos sistemas de transporte público em geral no Brasil, o crescimento do transporte privado é tão rápido, tão grande, que muitas vezes as medidas perdem eficácia rapidamente. Medidas têm que ser então cada vez mais radicais para restringir os transportes individuais e priorizar os coletivos.

Clique aqui e confira o estudo “Mobilidade urbana e posse de veículos: análise da PNAD 2009”, realizado pelo Ipea.

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