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Lula, o Senado e o Trânsito no Brasil. Um passo para frente e dez passos para trás.

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    Em pronunciamento oficial, junto a Organização Mundial de Saúde, o presidente Lula afirmou que a segurança no trânsito é prioridade em seu governo. É fato que avanços aconteceram a partir de 2008, especialmente com a Lei Seca e seus desdobramentos, capazes de reduzir a mortalidade no trânsito. Isto seria um ponto importante para que a era Lula fosse lembrada como o início da necessária transformação no cenário do trânsito brasileiro. Entretanto o senado, mergulhado em sua pior crise institucional e afrontando a câmara dos deputados, acaba de aprovar projeto de lei que, ao regulamentar a profissão de moto-taxi, cria para a sociedade brasileira  ameaça de proporções gigantescas e despreza o próprio poder legislativo uma vez que os deputados rejeitaram o moto táxi face à extrema insegurança e vulnerabilidade.
    A Associação Brasileira de Medicina de Tráfego e a Associação Nacional dos Transportes Públicos, entre outras tantas instituições de peso especializadas em segurança no trânsito, são contrárias ao transporte de pessoas por motos e já manifestaram publicamente este posicionamento. 
    São bem conhecidos os números oficiais relativos ao caótico cenário do trânsito no país: mais de 37.000 mortos e 400.000 feridos, anualmente, resultando, ainda, no estabelecimento de deficiências permanentes em 100.000 pessoas.
    Estas deficiências são, muitas vezes, extremamente graves. Registre-se que no Brasil o trânsito causa 4.000 traumatismos raquimedulares anualmente, que podem resultar em paraplegia e tetraplegia. As motocicletas se acidentam 7 vezes mais que outros veículos e seus acidentes sempre são mais graves e causam mais danos aos envolvidos.
    Em 1996 ocorreram 726 mortes de motociclistas que representaram 2,1% do total de 35.281 óbitos no trânsito naquele ano. Em 2000 ocorreram 2.465 mortes de motociclistas, que representaram, por sua vez, 8,5 % do total de 28.995 fatalidades registradas. A ocorrência deste tipo de evento, mortes de motociclistas, vem aumentando progressivamente e, em 2005, foram contabilizados 5.936 motociclistas mortos, que representaram 16,6% das mortes nas estradas e demais vias públicas do país. Sabe-se que na atualidade a mortalidade e a morbidade em acidentes com motos é o fenômeno que mais assusta a todos que trabalham com segurança no trânsito. As projeções indicam que, em 2009, motos estarão envolvidas em cerca de 30% das mortes, respondendo por cerca de 10.000 vítimas fatais.
    É importante frisar que, quando se verifica o comportamento das taxas de mortalidade por qualidade da vítima, a morte de motociclistas é a única que descreve trajetória de aumento ao longo dos anos. As demais categorias, que são pedestres, ciclistas, ocupantes e outros, permanecem estáveis ou sofrem redução nos últimos dois anos.
    Os motociclistas sofrem, ainda, com a segunda maior taxa de internação hospitalar por acidentes de trânsito, perdendo apenas para os pedestres.
    A imprensa tem divulgado, freqüentemente, os nefastos dados relativos ao falecimento de motociclistas que fazem moto frete. Apenas na cidade de São Paulo,  todos os dias dois motociclistas morrem  ao transportar cargas e documentos. No Brasil são 18 mortes por dia.
    Neste caso, apenas o condutor está em cima da moto.
    O transporte público tem uma característica indispensável: a universalidade, ou seja, deve ser capaz de transportar todas as pessoas, independentemente de idade ou condição física.
    Só isto já mostra a evidente inadequação do veículo para o transporte público. O CTB proíbe crianças em motos, face ao extremo perigo. Nos municípios do interior, onde esta atividade cresceu na ilegalidade, já temos as maiores taxas de mortalidade no trânsito do país. Estas taxas chegam a 35 mortos para cada grupo de 100.000 habitantes por ano, enquanto a média nacional está em 18 mortos por 100.000 habitantes por ano.
    Cabe uma pergunta: quem decidirá se o pretenso passageiro tem as habilidades quase atléticas necessárias para viajar de moto? Aquele que em ultima análise depende do dinheiro daquela corrida? Teremos uma mortalidade maior do que a registrada em  países vivenciando guerras.
    Se o governo não afastar a idéia do Moto-Taxi,  podemos esperar, no mínimo, cerca de 10.000 novas mortes por ano no trânsito do país, sem falar no caos que tomará conta das ruas, avenidas e estradas brasileiras. As repercussões sobre os congestionamentos e sobre o meio ambiente serão extremamente negativas e inevitáveis. Os custos com acidentes, hoje estimados pelo Ipea em 28 bilhões de reais, sofrerão significativo aumento e a conta será paga pela sociedade brasileira.
    O impacto desta ameaça na saúde pública é imediato e de grande magnitude, face à expressão dos gastos com os acidentes de trânsito no orçamento do SUS. As internações hospitalares por traumas no trânsito, que caíram em 2008 pela primeira vez em muitos anos, retomarão sua trajetória ascendente, lotando emergências,  UTIs, enfermarias e clínicas de reabilitação.
    É necessário lembrar dos desdobramentos na previdência social, com maior número de pensões e demais benefícios, e, finalmente, no consequente aumento do sofrimento humano frente às perdas evitáveis de vidas e de saúde dos brasileiros.
Entretanto, alguns setores podem ser beneficiados com a medida, tais como: fabricantes de motos e peças, fabricantes de caixões e cadeiras de rodas, funerárias e cemitérios.
    De positivo, apenas, vislumbra-se a possibilidade da matéria não progredir como atualmente se apresenta. Ou seja: está nas mãos do presidente e sua equipe vetar o projeto, pelo menos em parte, evitando que o transporte de pessoas possa ser feito em motocicletas. Lula, Dilma, Temporão e Fortes são neste momento a esperança de toda a comunidade de especialistas que trabalham com a prevenção de acidentes de trânsito. Eles podem evitar o luto que se avizinha com esta ameaça, salvando milhares de vidas, evitando agravamento da situação do SUS e da Previdência Social e principalmente evitando que este governo seja responsável pelo maior retrocesso no trânsito da história do país.


Fernando Duarte Lopes Moreira
Médico, Especialista em Medicina de Tráfego, Associação Brasileira de Medicina de Tráfego

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