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Por menos carros nas ruas

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    Nossas cidades estão tomadas pelos carros. Há menos de 20 anos, crianças brincando nas ruas ou indo a pé à escola era algo comum. Há 30 anos, passear de carro era um programa de fim de semana para várias famílias. Hoje, só em Curitiba, 1,8 milhão de habitantes competem por espaço com 1 milhão de carros. É uma mudança dramática em nossas vidas.
    Não há soluções mágicas; mas há meios de reduzir esse problema.
    Para cada família que usa o carro diariamente, a primeira sugestão seria a mais óbvia: deixe seu carro na garagem. E mesmo isso piora a sua qualidade de vida: se você mora em um edifício, cada carro ocupa cerca de 25 metros quadrados na garagem, pois para você manter o carro lá, estacionado, há a área das rampas de acesso à garagem e as de circulação e manobra. Uma família de casal e dois filhos vive confortavelmente em um apartamento de 100 metros quadrado. Mas será que os quartos dos filhos, juntos, têm 25? Se a família tem dois carros (o que não é incomum), eles ocupam 50% do espaço dedicado ao convívio familiar! E isso sabendo que, se­­gundo as próprias montadoras, um carro passa 90% de sua vida útil (da fábrica ao ferro velho) estacionado.
    Então, a melhor dica para essa família seria ficar com apenas um carro: seria, literalmente, tirar uma tonelada de dentro dos quartos de seus filhos.
    Ainda na família, o IBGE divulgou neste mês a Pesquisa de Or­­ça­­mento Familiar. No Paraná, as famílias gastam 27% de seu orçamen­­to com transportes. Com educação e cultura? Menos de 4%. Claro, isso é média e não inclui apenas carros – mas dá uma ideia das prioridades.
    Em 22 de junho na Gazeta do Povo, o colunista Franco Iacomini analisou os gastos de um leitor jovem, que ganha R$ 2 mil e que acaba de comprar um carro zero. O jovem gasta mais da metade do que ganha com o carro. Com educação, cultura, saúde, aperfeiçoamento profissional? Bem, já não sobra mais nada para gastar. O melhor investimento seria vender o carro.
    O estendido desconto do IPI do governo federal para a compra de carros ainda pesará em nosso bolso: além de ser imposto não recolhido que iria para diversos programas sociais, mais carros nas ruas inevitavelmente trarão mais despesas ao SUS, seja na área de ortopedia, na qual cresce o número de acidentados de trânsito; seja com doenças respiratórias: em São Paulo, como constatou o IPEA, elas estão diretamente ligadas à poluição do trânsito.
    O que a cidade pode fazer? Sinceramente, com o governo federal jogando contra, muito pouco. Reduzir os estacionamentos em áreas públicas, fiscalizar e punir aqueles que trafegam e estacionam perigosa e irregularmente, são medidas que vêm sendo tomadas em várias cidades, incluindo Curitiba, que devem ser apoiadas. Mas não dá para a cidade incentivar a expansão urbana, principalmente com condomínios fechados ocupados por famílias de alta renda – e consequente alto índice de motorização – sem se aperceber que está, ela própria, criando e agravando o problema.
    Finalmente, os grandes geradores de tráfego devem ser obrigados a arcar com sua parte da responsabilidade, como é o caso de shopping centers e hipermercados. Mas também as universidades, por dois motivos: algumas com mais de 15 mil estudantes indo diariamente às aulas, sempre nos mesmos horários, geram mais tráfego do que shoppings; e esses estudantes (50% motoristas) são jovens que não deveriam apenas estar sendo treinados em uma profissão, mas formados como cidadãos. As universidades poderiam fazer um excelente papel se estimulassem as caronas, dessem acesso preferencial àqueles que usam o ônibus ou bicicleta, fizessem escalonamentos de horários. Enfim, dessem à cidade a imagem que todos têm de um campus universitário: laboratórios, salas de aula, áreas esportivas e bibliotecas distribuídos em um grande parque – e não em um imenso estacionamento.
    Se você foi à banca a pé para comprar este jornal, já fez uma par­­te. E da próxima vez que ouvir alguém dizer que está preso no trân­­sito, lembre-se: ele não está no trânsito, ele é o trânsito.


Fábio Duarte
Diretor do mestrado e doutorado em Gestão Urbana da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR)


Originalmente publicado no jornal Gazeta do Povo em 25/06/2010.

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