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O futuro do transporte está nas bicicletas?

Especialistas falam sobre como alcançar o convívio harmônico entre os veículos motorizados e os não-motorizados, bem como sobre os espaços para a ciclomobilidade

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Manter a harmonia entre os 64 milhões de veículos motorizados que circulam pelo Brasil não é muito fácil. Congestionamentos, buzinas, acidentes já viraram rotina nas grandes cidades. Em tempos de lutas pelo meio ambiente e por uma maior qualidade de vida – o que passa também pela qualidade do trânsito –, um veículo não-motorizado reclama seu espaço: a bicicleta. Limpo e renovável por natureza, já que é a propulsão humana e não a combustão, as chamadas bikes ganham cada vez mais importância como alternativa verde de transporte, o que promove também saúde, esporte e lazer.
Mas alguns impasses surgem disso: como incentivar a ciclomobilidade? Como fornecer a devida segurança ao ciclista? E que tipos de vias são ideais para essa classe de tráfego? É consenso entre os especialistas de que, para se alcançar uma real harmonia entre os veículos motorizados e os não-motorizados, é necessária uma infraestrutura adequada (ciclovias, ciclofaixas, entre outras), bem como medidas de educação e fiscalização em relação ao uso e ao respeito a esses espaços. Igualmente importante seria priorizar – em planejamentos e ações – o transporte coletivo.
“É preciso acabar com a grande insistência nas soluções pontuais, imediatistas e provisórias, que sempre serão necessárias, porém não atuam sobre a base”, defende o arquiteto e urbanista Nei Simas, consultor especializado em Transporte Urbano pela Universidade de Brasília. “Enquanto a Engenharia de Tráfego der prioridade para as obras de ampliação do sistema viário e mais prioridade ainda para o transporte individual, deixando de lado o disciplinamento da operação de tráfego e a segurança, o chamado caos urbano vai se agravar cada vez mais, o que aumenta a desarmonia já existente”, completa.



Foto de 2005 mostra homem carregando a filha em uma
via da zona norte de Natal (RN), em um transporte de
alta periculosidade, sem proteção em relação aos outros
veículos. (Crédito: Nei Simas)

Já o coordenador de Comunicação da Associação dos Ciclousuários da Grande Florianópolis (ViaCiclo), André Soares, explica que as cidades, carentes – em geral – de um planejamento urbano, cresceram desordenadamente e conforme as exigências do mercado (especialmente o imobiliário, o comercial e o automotivo). “Com isso, o poder público age com medidas corretivas ou adaptativas, alargando vias, construindo viadutos e túneis, mesmo que isto signifique alterar a arquitetura urbana ou a base geográfica natural”, afirma ele, que – além de mestre em Sociologia Política – já foi membro do Conselho Municipal de Transportes de Florianópolis e secretário-executivo da União de Ciclistas do Brasil (UCB). “A única maneira de os ciclistas, pedestres e motoristas conviverem harmonicamente é planejar e gerir a cidade para as pessoas, e não para as máquinas, buscando o convívio nas vias públicas, ao invés de territorializá-las exclusivamente para os veículos motorizados”, acrescenta.

INFRAESTRUTURA CICLÍSTICA: POR ONDE COMEÇAR?
Com quase 1,1 milhão de habitantes, Campinas – terceiro maior município paulista – já começou a se movimentar no sentido de oferecer a infraestrutura necessária para os ciclistas. No último dia 23, foi inaugurada a ciclofaixa “Campinas – Cidadania em Movimento”, com 18 km de extensão, na região central da cidade. Voltado ao lazer, o espaço só funciona aos domingos e feriados, das 7h às 13h, apoiado por uma grande operação de trânsito, que custa mais de R$ 20 mil por dia à Prefeitura. A média de público usuário tem sido entre 3 mil e 5 mil ciclistas, inclusive de outras cidades. Até maio deve ser entregue nova ciclofaixa, com 10 km de extensão. Mais do que iniciativas isoladas, os projetos fazem parte do Sistema Cicloviário de Campinas, lei que prevê cerca de 100 km de ciclovias e ciclofaixas que – diferente da via inaugurada – serão de uso diário.


Mais de 5 mil ciclistas compareceram ao primeiro domingo de funcionamento da nova
ciclofaixa de lazer de Campinas, no último dia 23. (Crédito: Emdec)


Foto mostra a nova ciclofaixa de lazer de Campinas em dias úteis: marcação indica o
funcionamento para domingos e feriados, das 7h às 13h. (Crédito: Emdec)

“Os estudos começaram em 2005, quando fizemos os primeiros bicicletários e recuperamos uma ciclovia e uma ciclofaixa que já tínhamos. Em 2006, preparamos um plano cicloviário para a cidade, discutido entre a Câmara Municipal e a Prefeitura. Em 2007, o projeto foi aprovado pelo Legislativo, dando as diretrizes para os investimentos em deslocamentos por bicicletas. De lá para cá, de forma gradativa, fomos aumentando os espaços para este fim: sempre que uma nova avenida é planejada, incluímos também esse tipo de espaço no planejamento”, conta o secretário de Transportes, Gerson Luis Bittencourt, que também é presidente da Empresa Municipal de Desenvolvimento de Campinas (Crédito: Emdec).
A iniciativa da cidade paulista é um passo alinhado ao que dizem os especialistas. “Deve-se sempre considerar a existência de um sistema, que envolve infraestrutura, planejamento, legislação, fiscalização e controle da operação de tráfego e transporte público, para que motoristas, ciclistas, pedestres e passageiros de transporte público possam conviver em harmonia”, comenta Nei Simas.


Apesar de investimentos em infraestrutura para a ciclomobilidade, são
necessárias ações de educação e fiscalização para garantir exclusividade do
espaço aos ciclistas. (Crédito: ViaCiclo)

O urbanista sugere ainda que o sistema cicloviário não seja considerado apenas um espaço diferenciado, mas que tenha todo um planejamento por trás, levando em conta aspectos como: 
• é necessária a montagem de redes de eixos de transporte não-motorizado, não de ciclovias isoladas;
• deve haver o mínimo de proteção ao ciclista contra as intempéries (arborização para proteger da insolação, iluminação especial para maior segurança, pequenos espaços cobertos a cada 300 ou 400 metros para abrigo contra as chuvas, etc);
• há que ter paraciclos espalhados por toda a área urbana e bicicletários em pontos estratégicos, como estações de metrô e terminais de transporte coletivo;
• a obrigatoriedade de transporte de bicicletas em todos os meios de transporte público, com tarifa integrada, também é uma medida fundamental de estímulo à ciclomobilidade.


Bicicletário do Terminal Transmilenio, em Bogotá (Crédito: Nei Simas)

A opinião é compartilhada por André Soares, da ViaCiclo, que acrescenta que o fornecimento de bicicletas públicas ou de aluguel também é importante. “É preciso ainda incluir nas atribuições do Conselho de Transporte/Trânsito local a mobilidade ciclística e a integração intermodal, ampliando a participação da sociedade civil no processo deliberativo”. Além disso, para ele a iniciativa privada pode se inserir no processo com a implantação de bicicletários para clientes e funcionários e, para estes, vestiários com duchas, o que pode ser incentivado pelo poder público.

REFERÊNCIAS
Muitas cidades ainda carecem de avanços nesse sentido, mas não faltam referências, no Brasil e no exterior, que auxiliam na implantação desse tipo de política. Cidades como Ribeirão Preto, Sorocaba, Santos e Teresina são citadas como locais com investimentos crescentes na área. O Rio de Janeiro se destaca por estar, segundo Nei Simas, implantando uma “verdadeira rede de ciclovias, porém como um programa isolado dos demais modos de transporte”.
Fora do País, Amsterdã e Roterdã, na Holanda, são referências internacionais. Londres inaugurou em julho de 2010 pistas rápidas exclusivas para bicicletas – conhecidas como Barclays Cycle Superhighways, que estimulou o aumento do uso deste modo em 70%, segundo relatório publicado pela Transport for London (TfL). Outro destaque fica para Bogotá, na Colômbia, que tem uma das maiores redes cicloviárias do mundo. “A cidade construiu ciclovias e bicicletários e apoiou a criação e consolidação do serviço de bici-táxis nas áreas periféricas, criando empregos”, conta Simas.
A exemplo dessas cidades, o desafio das brasileiras que ainda estão em processo de planejamento ou implantação de políticas para a ciclomobilidade, é avançar em um plano de longo prazo. “A população não pode deixar recuar; tem que ser um projeto da cidade, não de um governo; quando isso acontece, não existe possibilidade de retrocesso”, afirma Gerson Luis Bittencourt, presidente da Emdec. “O ciclista, para ser incluído, precisará se movimentar não apenas na via pública, mas politicamente; precisa cumprir a cidadania, que se refere não apenas ao usufruto dos direitos e ao cumprimento dos deveres, mas fundamentalmente ao processo contínuo da elaboração destes”, finaliza André Soares.


Para André Soares, a participação popular é fundamental para
alcançar a harmonia no trânsito entre pedestres, ciclistas e
motoristas. (Crédito: ViaCiclo)

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