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Estresse no trânsito: saiba como superar esse perigoso inimigo

por Milton Corrêa da Costa*

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Não se pode mais deixar de correlacionar os constantes engarrafamentos de trânsito nas saturadas vias dos grandes centros urbanos –nas rodovias o fenômeno também é observado nos congestionamentos durante os feriadões- face o crescimento da frota de veículos e a consequente diminuição dos espaços viários, ao que se convencionou chamar de ‘estresse no trânsito’. Em dias de tempestade e ruas alagadas e intransitáveis a coisa é ainda pior. Além disso, a violência criminal, trazida em grande parte nos últimos anos pelo aumento do consumo e tráfico de drogas no país, gerando na população a síndrome do pânico e o medo concreto e presumido do crime (ninguém se sente seguro num sinal de trânsito em local ermo), também contribui sobremodo para o estresse no trânsito, uma grave doença social dos tempos modernos.
Estamos diante de um perigoso inimigo que produz, pois, o desequilíbrio emocional e muitas vezes se torna fonte geradora de crimes e grandes tragédias. Basta que se tenha ao alcance uma arma de fogo ou uma chave de rodas, chave de fendas, barra de ferro ou a fúria descontrolada da força física e emocional como ferramentas para causar no outro motorista grave lesão ou a morte ou se tornando, num efeito bumerangue, a vítima de uma briga de trânsito. Passada a crise de estresse vem o arrependimento tardio dos oponentes.
Ou seja, o estresse é sem dúvida causa de hiperagressividade no trânsito criando até mesmo monstros assassinos do volante. O pior é que se verifica que o volante de um carro também se tornou uma forma disfarçada de descontar nossas frustrações em relação a outros problemas do cotidiano de nossas vidas. É o que a psicologia chama de “transferência”. Ao invés de expressar nossos sentimentos ao que ou a quem está nos causando irritação, acabamos direcionando e estourando nossos problemas no volante de um carro.
A própria Psicologia de Trânsito, ramo da referida ciência que estuda o comportamento humano na condução veicular, não consegue explicar o que faz com que pessoas de boa educação e de convívio social pacífico transformem-se em hiperagressivos, deseducados e estressados do volante, verdadeiros donos do seu espaço e dos demais em vias públicas. Uma simples discussão no trânsito, o arranhão ou amassado em nosso veículo causado pelo outro -nunca achamos que a culpa é nossa- ou uma fechada durante o deslocamento pode ser a gota d’água para uma tragédia. A nefasta cultura da propriedade do bem material, cada vez mais arraigada pela ambição desmedida do homem (cultura do ter e não do ser) sobrepuja, no trânsito, o respeito até mesmo à vida do próximo. Isso também é fato real.
Para superar os problemas inerentes ao estresse ao volante veja o que escreveu a respeito do tema a consultora de qualidade, a norte-americana M. J. Ryan, autora do livro “O Poder da Paciência” e outros títulos. Ryan conta que sua amiga Sylvia Boorstein, certa ocasião, falou-lhe sobre um motorista com quem ela uma vez ficou presa em um engarrafamento quando estava indo participar de um programa (ao vivo) de televisão. O motorista trabalhava para a emissora e, portanto, sabia o quanto era importante cumprir o horário. No entanto, embora estivessem praticamente parados, ele não perdeu a calma uma única vez e conseguiu fazer com que ela chegasse pontualmente. Quando Sylvia perguntou o que lhe dava capacidade de ficar tranquilo apesar das enervantes circunstâncias em que se via envolvido todos os dias, o homem explicou: “O que faço poderia se tornar uma dor de cabeça pra mim se eu permitisse que assim fosse”, disse.
Ryan diz que este motorista sabia algo que muitos de nós precisamos lembrar: “PODEMOS ESCOLHER A MANEIRA PELA QUAL REAGIMOS ÀS SITUAÇÕES EM QUE NOS ENCONTRAMOS (grifo nosso). Prossegue em seu ensinamento afirmando que para a maioria de nós, essas circunstâncias envolvem imensas quantidades de tempo em ruas e estradas engarrafadas. “Passamos muito tempo no trânsito, o trajeto de ida e volta do trabalho é o horário ideal para se praticar a paciência. A paciência fará com que não causemos acidentes ao ficarmos mudando de pista o tempo todo, a manter a distância necessária do carro da frente no anda e para e não darmos cortadas nos outros veículos. E quando os outros motoristas se comportarem mal conosco, a paciência nos permitirá evitar uma confrontação cujo resultado pode ser desastroso. Se um motorista agressivo ou uma simples fila de carros parados o está irritando, é útil relaxar conscientemente seu corpo, especialmente suas mãos que seguram o volante. Olhe a paisagem em volta, descubra uma excelente estação de rádio ou ouça CDs. Note a diferença que a escolha de manter a calma faz em seu percurso e na maneira como você se sente ao chegar”, completa a famosa escritora americana.
Outro ensinamento interessante e muito simples é sobre o controle da respiração sobre o estresse momentâneo ao volante, citado pelo escritor alemão Eckhart Tolle em seu livro “O Poder do Agora”. Tolle lembra que nessa situação respirar fundo é fundamental. “Observe atentamente a sua respiração, sinta o abdômen inflar e contrair-se levemente, a cada inspiração e expiração. Em alguns segundos entre em contato com o seu corpo interior e tome consciência da serenidade. Só se estivermos conscientes seremos capazes de usar a mente de forma criativa”, diz o escritor.
O fato é que trânsito e estresse são temas correlacionados atualmente. E é uma relação cíclica, sem causa e efeito delimitados. Um ajuda a alimentar o outro. Ressalte-se também que ações de exibicionismos e imprudência ao volante de um carro ou na condução de uma motocicleta, pelo excesso de velocidade e manobras arriscadas, numa perigosa demonstração de perícia, são frequentes sintomas em condutores que passam por algum tipo de estresse e buscam nas “sensações” da direção veicular uma forma de “catarse“ e fuga.
Com a palavra os estudiosos em Psicologia de Trânsito. Há um perigoso exército de homens-bombas e mulheres-bombas no trânsito brasileiro, prontos a explodir a qualquer momento, acometidos da grave doença social do estresse ao volante. Se considerarmos, por exemplo, que de cada três entre dez habitantes da capital paulista apresentam algum transtorno mental, como mostrou recentemente o Instituto de Psiquiatria (IPq) do Hospital das Clínicas de São Paulo, e se observarmos que muitos destes são condutores de veículos, concluímos que o perigo do estresse no trânsito é ainda muito pior.
A paciência, como estratégia do bom senso, até que se prove em contrário, continua sendo o melhor remédio. É melhor perder um tempo, com calma, ao volante de um veículo do que ser dominado pela fúria e pelo estresse do trânsito. É uma simples questão de escolha. Uma linha às vezes muito tênue entre a vida e a morte.

 

*Milton Corrêa da Costa
Coronel da reserva da PM do Rio de Janeiro

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