Para pai de vítima do trânsito, penas alternativas comparam a morte de seu filho a grãos de arroz e feijão.
Indignação, sensação de impotência e, até mesmo, descaso são algumas das reações que os crimes de trânsito causam. Casos escandalosos, como o do motorista gaúcho que avançou numa marcha de ciclistas ou então do condutor alcoolizado de um Porsche em São Paulo, ganharam a atenção da mídia e da população, assim como a decisão dos juízes de definir os crimes como culposos e não dolosos.
A sutileza da linha que separa a ‘culpa’ do ‘dolo’ num trâmite judicial é um problema apontado pelos juristas, principalmente, quando o assunto é trânsito. Em seu artigo Como diferenciar culpa e dolo eventual nos acidentes, o advogado e doutor Luiz Flávio Gomes ilumina os conceitos: “dolo eventual ocorre quando o agente prevê o resultado, aceita-o (assume o risco de produzi-lo) e atua com indiferença frente ao bem jurídico lesado. O dolo eventual não pode ser confundido com a culpa (consciente ou inconsciente), visto que nesta o agente não aceita o resultado nem atua com indiferença frente ao bem jurídico”, ensina.
Na prática a questão não é tão simples, pois nem sempre contamos com provas. Segundo Gomes, outra diferença marcante entre os conceitos é que, “no crime culposo o agente, se soubesse que iria matar alguém, não teria prosseguido na sua ação. No doloso, o agente, mesmo sabendo que pode matar alguém, prossegue no seu ato”, esclarece.
Aliada à dificuldade de conclusão entre intenção ou inocência, está a sensação de impunidade muito forte sob a perspectiva das famílias das vítimas. O engenheiro Fernando Diniz perdeu seu filho de apenas 20 anos num acidente e, a partir de sua experiência pessoal, decidiu criar a ONG Trânsito Amigo, que apresenta um dos trabalhos mais relevantes em educação e militância pela segurança no trânsito brasileiro.
Na opinião de Diniz, as penas para quem mata no trânsito são muito brandas ou ineficazes: “Edmundo Animal, Alexandre Pires, Renner, Felipe Camargo e Fernando Carli Filho são alguns nomes que podemos citar de pessoas que receberam penas próximas do mínimo ou alternativas. Para quem tira uma vida no trânsito, a sentença é apenas o pagamento de uma cesta básica, isso compara a vida de nossos filhos a grãos de arroz e feijão”, diz.
Para o professor do Complexo Educacional Damásio de Jesus e promotor do 1º Tribunal do Júri de São Paulo, Luiz Fernando Vaggione, do ponto de vista legal as penas não são brandas. Num crime de homicídio culposo no trânsito, a pena mínima é de dois e vai até quatro anos. Mas, ela pode ser substituída por trabalho comunitário, multa reparatória, uma indenização mínima ou suspensão da habilitação. O que dificulta o processo é o tempo: três a quatro anos. A punição demora a vir, aí vem o esquecimento, que apaga a repercussão social do fato e gera a sensação de impunidade”, avalia.
Outro fator apontado pelo promotor que torna mais difícil a punição é o perfil do infrator de trânsito. “Quem causa os acidentes não tem uma ficha criminal, o que repercute na pena. Assim, a interpretação do juiz tende a ficar muito próxima da pena mínima estabelecida”, explica.
Os crimes de trânsito estão mais frequentes e também mais violentos, o que, de certa forma, exige uma mudança de comportamento do judiciário. As acusações são cada vez mais vistas em trâmite no Tribunal do Júri, segundo Vaggione. “Atribuo esse aumento de casos à sensação de impunidade, maior número de frota e motoristas, além do abuso de drogas e álcool”, e cita um exemplo claro da impotência do judiciário perante a falta de provas: “O crime de embriaguez ao volante é o segundo mais grave (o primeiro é o de homicídio culposo). O judiciário esbarra numa grande dificuldade, que é a ausência de perícia técnica; porque o indivíduo não é obrigado a produzir provas contra si, pode se eximir de fazer o teste do bafômetro. Porém, há maneiras de identificar a embriaguez do condutor, dependendo do estágio em que ele se encontra. Nesses casos, sou a favor da punição instantânea por parte da autoridade de trânsito”, detalha.
Crédito: Trânsito Amigo
Campanha da Camisa 10 para a Trânsito Amigo: imagens impactantes para chamar atenção dos motoristas
Educação, a pedra fundamental da segurança no trânsito
Segundo o IPEA (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) e do Ministério da Saúde, são gastos, aproximadamente, 40 bilhões de reais por ano com acidentes de trânsito. Na contramão, não se investe nem um bilhão em prevenção ou educação.
“Continuamos morrendo no asfalto. É necessário, portanto, educar, mas também reprimir, pois só assim evitaremos desestimular aqueles a quem pretendemos educar”, pontua Fernando Diniz. Pensando nisso, a Trânsito Amigo realizou a parceria com a agência de publicidade Camisa 10 para veicular uma campanha de impacto sobre as tragédias de trânsito. “Considero que toda campanha neste sentido deva ser forte para sensibilizar a sociedade sobre os prejuízos de uma direção perigosa. É uma campanha forte, pesada, mas de teor extremamente autêntico”, descreve.
A campanha traz placas com personagens que seriam os causadores de acidentes em processo de “fichamento” na polícia, mostrando seus rostos e identificando com as placas os nomes de suas vítimas. “Esta é uma situação fora da realidade permitida em nossas leis, mas é uma forma de mostrar aos maus condutores que algo começa a mudar já no processo de indiciamento das ações criminosas no trânsito. É também uma forma de provocar a reação da sociedade organizada, mostrando que qualquer um pode ser a próxima vítima fatal ou continuar a viver com necessidades especiais ou até mesmo de forma vegetativa”, alerta Diniz.
Nascemos do ideal por um transitar seguro e há três décadas nossos valores e pioneirismo nos permitem atuar no mercado de ITS atendendo demandas relativas à segurança viária, fiscalização eletrônica de trânsito, mobilidade urbana e gerenciamento de tráfego.