Quando recebi as indagações da Perkons sobre a aplicação de R$ 24 bilhões em ações de trânsito e transporte fiquei bastante intrigada. Ora me parecia ser bastante dinheiro, ora parecia pouco para ações urbanas em todo o Brasil.
Cheguei a conclusão que este dinheiro deveria ser aplicado em questões e obras simples que sempre dissemos que as cidades deveriam ter e fazer e nunca havia dinheiro para tal. O futuro da Política Pública de Mobilidade, se mantidas as estimativas de crescimento de 2,5% da população urbana brasileira e de 4% da frota de veículos, é mais e maiores congestionamentos nas grandes cidades brasileiras que já representam 506 milhões de horas gastas a mais por ano pelos usuários do transporte coletivo, 258 milhões de litros de combustível gastos a mais por ano e uma poluição ambiental que pode ser medida em 123 mil toneladas de monóxido de carbono e 11 mil toneladas de hidrocarbonetos, jogados na atmosfera, segundo dados da ANTP – Associação Nacional de Transportes Públicos. A qualidade de vida das cidades está degradada devido aos congestionamentos e a ocupação desordenada dos espaços. Portanto estes 24bi devem ser aplicados em obras e ações que melhorem a qualidade e vida das pessoas que moram nas cidades. Para tal é preciso ter um transporte público de qualidade e, por conseguinte, um bom trânsito.
Engajamento popular
Já que teremos 24bi para gastar e sabemos que não dá para os mais de cinco mil municípios,
podemos também propor diretrizes e metas para o que não der para ser feito agora possa ser implantado mais para a frente. Alguns princípios básicos devem ser seguidos como uma discussão transparente com a sociedade, a responsabilização pública pelas ações e o princípio da cidade para todos. A participação cidadã deverá ser garantida tanto no nível dos movimentos populares, quanto da sociedade civil organizada e dos cidadãos não engajados, fomentando um efetivo controle social das políticas públicas de mobilidade.
Estrutura adequada
Na verdade eu iniciaria minhas ações com a estruturação dos órgãos de gerência de transporte e trânsito dos três níveis de governo. Só assim poderemos ter a certeza que a verba será utilizada com eficiência. Começaria com o fortalecimento e democratização do Departamento Nacional de Trânsito – Denatran e da Semob para que possam cumprir seu papel e coordenar a mobilidade urbana no Brasil.
A seguir, estimularia reformas institucionais que removam os Detrans da alçada das Secretarias de Segurança Pública com a finalidade de que eles realmente possam cumprir seu papel no Sistema Nacional de Trânsito de forma integrada às demais políticas públicas relacionadas à circulação.
Nesta perspectiva, faria uma forte ação de gestão nacional na moralização dos Detrans e no acompanhamento dos processos de habilitação de condutores. Garantiria a seguir o fortalecimento das gestões locais e regionais dos serviços de transporte e trânsito.
Transporte Público
Proponho uma sincronia entre a política de transporte e mobilidade urbana e os recursos nas diferentes estruturas federativas. Não dá para haver contradições entre as diretrizes da política e os investimentos governamentais. Não promoverei incentivos fiscais e obras de infra-estrutura para privilegiar o transporte individual em detrimento do não motorizado e do coletivo bem como não deixarei de prover recursos incluídos nos programas de habitação. As soluções viárias, como construções de avenidas e pontes, se saturam rapidamente com o aumento cada vez mais rápido da frota de automóveis. Portanto a luta pelo transporte público de qualidade, acessível para todas as classes sociais, confortável e eficiente está apenas começando, existe um longo caminho a ser percorrido para alcançarmos patamares aceitáveis. Priorizaria a circulação, fluidez e a paz no trânsito dos meios de transporte coletivo e do transporte não motorizado, como forma de garantir um crescimento urbano sustentável e uma apropriação mais justa e democrática dos espaços públicos.
Várias cidades deverão implantar seus corredores como Curitiba e São Paulo. Preferencialmente com plataforma de embarque no canteiro central, em nível com os ônibus para facilitar o embarque e o desembarque e duas faixas para o ônibus poder ultrapassar. Mas a grande referência hoje na América Latina em corredor de ônibus é a cidade de Bogotá, na Colômbia, com o Transmilênio, que avança muito mais do que as experiências que temos no Brasil. O corredor melhora muito o transporte.
Priorizarei os recursos com a renovação dos ônibus com veículos acessíveis a pessoas portadoras de deficiência e com combustíveis limpos.Para de fato dar prioridade no transporte público ainda reservarei parte dos valores para a pavimentação de vias de transportes coletivo e calçadas.Para finalizar as ações de prioridade ao TP ainda investiria e um “Fundo Nacional para o Barateamento das Tarifas” priorizando as pessoas que não tem recursos para pagar as passagens e muitos nem conseguem procurar empregos sem sair dos bairros.
Trânsito Seguro
Todo acidente pode e deve ser evitado. Vou seguir os muitos os exemplos de sucesso no mundo. Países que conviveram com o mesmo problema e que decidiram, em saudável cumplicidade com a sociedade, adotar a velha, porém infalível fórmula que combina regras severas com educação rotineira, fiscalização permanente e punição célere e justa para os infratores. Com base nisto eu seguiria o que a Organização Mundial da Saúde propôs como passos básicos para reduzir a mortalidade no trânsito, que são a defesa da:
1 – Criação de uma agência governamental única para tratar especificamente da violência no trânsito. É preciso adotar medidas para padronizar as informações mínimas a serem coletadas para fins de estatísticas dos acidentes, permitindo-se ter uma visão o mais real e ampla possível do problema e, a partir daí, adotar as políticas necessárias. Centralizar as ações melhora a gestão, segundo a OMS.
2 – Adoção de padrões rigorosos de segurança dos veículos, que devem ser fiscalizados também rigorosamente pelos governos.
3 – Investimento em infraestrutura, tanto de vias de trânsito, calçadas, faixas de pedestres, semáforos, centrais de controle integrando o trânsito e o transporte público e também nos hospitais.
4 – Mudança de comportamento da população (redução de velocidade; fim da mistura álcool e direção; eliminação da falta de capacete; uso do cinto de segurança; uso de equipamentos de segurança para crianças).
5- Apoio as atividades de educação no trânsito no âmbito nacional com acompanhamento através de um sistema de informações específicas sobre as ações de educação de trânsito.
6 – Uma política adequada de segurança que deve buscar reduzir a exposição ao risco, a quantidade e a severidade dos acidentes e os danos às vítimas. Entre as medidas que diminuem a exposição ao risco a prioridade será a instalação de medidores de velocidade tem o objetivo de fiscalizar o tráfego de veículos acima da velocidade regulamentada. É preciso reavaliar a exigência da sinalização dos locais de implantação dos medidores de velocidade, suprimindo as alterações feitas. Isto é uma realidade que precisa ser considerada, pois nos locais onde há este tipo de fiscalização, o número de acidentes diminui em média 30% e o número de mortes cai 60%. Cada vida salva resulta numa economia de R$ 110 mil para a sociedade segundo estudos sobre custos dos acidentes no Brasil realizados pela ANTP- Associação Nacional de Transportes Públicos e pelo IPEA- Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada. Um sistema de trânsito seguro só pode ser estabelecido com uma fiscalização eficiente que detecte, identifique e puna os infratores.
7 – Investimento na análise e formulação urgente de uma política pública específica para as motocicletas e regras rigorosas para a fabricação e para o trânsito de motos. Chamaria a indústria do setor que também deve ser questionada sobre seu papel na mobilidade sustentável urbana já que ela vive o bônus do aumento de vendas contra o ônus para o Poder Público e para a sociedade com as externalidades negativas do uso da moto, Ou o setor parte para uma prática socialmente sustentável e enxerga o problema ou vão começar a receber restrições urbanas.
Transporte não motorizado
O pedestre vem tendo seu direito de ir e vir cerceado paulatinamente em favor dos outros atores que circulam pelas cidades. Todos os motoristas são pedestres em alguma hora do dia e, mesmo assim, este fato não impede que se comportem como “inimigos”, gerando situações de conflitos e insegurança.
O pedestre não tem recebido tratamento adequado às suas necessidades de caminhar com conforto e segurança.Prova disto é que os atropelamentos são a principal causa de morte na maioria das cidades brasileiras. Proponho reconquistar o sistema viário – ruas, calçadas, as travessias e passeios – para uso e deslocamento seguro e confortável, implicando em dar-se atenção redobrada as obras e ações para as áreas de circulação a pé. A implantação e manutenção de calçadas devem ser priorizadas nos investimentos nas vias de grande movimentação.
Bicicletas
O Brasil é o terceiro produtor mundial de bicicletas e o quinto maior mercado consumidor. Nós já temos mais bicicletas que automóveis. A frota estimada de bicicletas é de 60 milhões e a de automóveis, 50 milhões.
Deslocamentos por bicicleta representam quase 6% do total de viagens e é bom salientar que as viagens urbanas de bicicleta já ultrapassam as viagens com o uso do táxi. Qualquer percurso de menos de 3 km é ideal para fazer de bike.
Seria uma ótima alternativa de transporte para os brasileiros,o transporte por bicicletas. Proponho fomentar a priorização da implantação de estruturas de ciclovias, ciclofaixas, além de bicicletários e teríamos uma importante contribuição para o caos motorizado em que se encontram nossas cidades.
Enfim, para que a população brasileira viva com qualidade temos que erradicar a violência no trânsito e proporcionar uma mudança cultural e uma democratização do uso do espaço urbano. Proponho uma nova postura, uma atitude mais firme em defesa da vida e do meio ambiente. Espero que estes 24bi possam ser o primeiro passo para uma política pública que atenda os interesses do coletivo preservando a qualidade de vida de todos que vivem e circulam no país.
Cristina Baddini Lucas, Consultora do Diário do Grande ABC, Diretora da ONG Rua Viva, Assessora do MDT
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