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Transporte: Idade da razão

por Claudinei Brogliato*

Para cumprir a lei, as transportadoras terão arcar com o risco de dívidas de financiamento, e a maioria não consegue repassar totalmente o aumento do custo para o cliente

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Até julho de 2011, o setor de transporte profissional de pessoas por fretamento, que serve a região metropolitana do Estado de São Paulo, deverá renovar 35% dos veículos de sua frota, com idade superior a 15 anos. Isto é o que determina o Decreto Estadual nº 55.925, de 18 de junho de 2010. Nada mais justo, cumprir a lei é dever de todo cidadão honesto cumpridor de suas obrigações!
O problema é quando para cumprimento da legislação vigente, dependemos de terceiros. Foi assim com as cadeirinhas de bebês, cuja fiscalização precisou ser adiada, pois os fabricantes não conseguiram atender à demanda de compradores que surgiu de uma hora para outra e, novamente, está acontecendo neste exato momento, com a troca de nossos ônibus. Os fornecedores já estão pedindo de 90 a 120 dias de prazo para a entrega de um veículo novo.
Consideremos que existem hoje 15.400 ônibus de fretamento circulando em São Paulo e desses, 4.700 veículos em circulação nas regiões de São Paulo, Campinas e Baixada Santista terão que ser substituídos no curto prazo. Ou seja, não haverá tempo hábil para que todas as empresas se preparem para cumprir o decreto de renovação da frota.
As empresas de transporte profissional de passageiros já executam as trocas dos veículos com frequência, mas devido à grande procura atualmente, a oferta está escassa! Apesar das previsões de 40% de crescimento em 2011, a capacidade operacional da indústria de produção de ônibus e micro-ônibus será insuficiente para atender toda a demanda necessária. Muitas empresas fornecedoras de veículos pesados alegam ter dificuldades para importar peças. Esses componentes não estão chegando em quantidade suficiente para atender todos os pedidos.
Ainda mais: além dos 35% que devem ser substituídos no primeiro ano; outros 35% deverão ser renovados no segundo ano e 30% no terceiro. Até 2013, nenhum veículo da frota de transporte profissional de pessoas poderá ter idade superior a 15 anos e as empresas transportadoras que descumprirem o prazo temem ser excluídas do cadastro e ficar impedidas de prestar serviço em plena Copa do Mundo, em 2014.
O prazo de três anos é muito curto para a renovação de toda a frota de ônibus e micro-ônibus, além disso, afeta a estrutura financeira das transportadoras. Pelo que antevemos, se o poder público não tiver o bom senso de ampliar a data-limite para a troca, não apenas as 1.841 empresas de transporte por fretamento, mas toda cadeia de transporte coletivo privado sairá prejudicada.
As medidas impostas afetam também os fornecedores, que não têm como atender a demanda; atingem os passageiros que trafegam entre uma cidade e outra nas regiões metropolitanas de São Paulo, Campinas e Baixada Santista, pois correm o risco de ficar sem o serviço; uma vez que as empresas que não puderem renovar a frota a tempo terão que diminuir o número de veículos para realizar o transporte. Ainda encarecem a prestação de serviços, pois os repasses das operações de substituição já devem refletir-se na renovação dos contratos nos próximos meses.
Para cumprir a lei, as transportadoras terão arcar com o risco de dívidas de financiamento, e a maioria não consegue repassar totalmente o aumento do custo para o cliente. A desoneração do transporte seria uma das formas de auxiliar as transportadoras a renovarem sua frota. Afinal, cabe aos nossos governantes buscar soluções que privilegiem a mobilidade coletiva em detrimento da individual.
Perde também o meio ambiente! Pois outra questão que aflige os empresários é o que fazer com os veículos em desuso, já que por terem seu prazo de validade expirado, devem ir literalmente para a lata do lixo, uma vez que não podem ser reaproveitados. Esse fato causa indignação ao setor profissional de ônibus por fretamento, que é visto por especialistas como uma fonte de melhoria da mobilidade no trânsito e da sustentabilidade do planeta.
Os ônibus de fretamento rodam, em média, a metade dos quilômetros rodados pelos veículos de transporte público. Assim, no serviço de fretamento, um ônibus com 15 anos de fabricação ainda está em muito bom estado e poderia ser aproveitado, tanto para o transporte coletivo quanto para tantos outros serviços, para os quais o veículo poderia ser adaptado, como bibliotecas itinerantes, juizados de conciliação itinerante etc. Mas, o atropelo da medida não permitiu criar uma saída de cena honrosa para os mais de 4000 veículos que diariamente transportam milhares de pessoas.
Sequer nossos governantes se preocuparam em conceder algum tipo de benefício fiscal, para a aquisição desses veículos novos, para um setor da economia vital para a mobilidade das três regiões metropolitanas do Estado de São Paulo. O serviço de fretamento opera 24 horas por dia e atende a demanda de transporte de mão de obra para todas aquelas empresas que trabalham em turnos ininterruptos de revezamento, e não são atendidas pelo transporte público. Se o governo federal, recentemente, pôde conceder a redução do IPI para automóveis, por que a esfera estadual não poderia pensar em algo do gênero para as empresas de fretamento renovarem suas frotas?
Com um volume de negócios na casa dos R$ 56,5 bi, o turismo rodoviário poderá ser mais uma vítima do descaso das autoridades públicas. Só os coletivos que trafegam pelas estradas paulistas representam 43% do turismo regional brasileiro. É preciso antecipar-se para as carências de infraestrutura requeridas para o megaevento da Copa do Mundo em 2014. Sabe-se que os turistas que virão assistir aos jogos devem viajar distâncias de até 300 km a partir das cidades-sede. São Paulo tem a melhor malha do País, o que favorece a prática das viagens rodoviárias. Isso significa que, além da exigência da renovação, imposta pelo governo estadual, o segmento precisará ampliar a frota atual para atender a demanda gerada com a Copa.
O investimento, no entanto, depende muito da vontade política do setor público em melhorar as condições de trabalho das operadoras de transporte rodoviário, para facilitar e gerar conforto aos torcedores nos deslocamentos previstos aos pontos turísticos. A nosso ver, somente um incremento no turismo rodoviário, fará com que as empresas, nas condições atuais, se interessem em retomar a aquisição de frota dedicada a esse setor.

 

*Claudinei Brogliato
Empresário do setor de fretamento e presidente da FRESP — Federação das Empresas de Transportes de Passageiros por Fretamento do Estado de São Paulo (www.fresp.org.br). E-mail: linkfresp@linkportal.com.br

Opinião originalmente publicada no portal INCorporativa, em 17.12.2010.

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