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As doenças que o trânsito causa

Os congestionamentos causados por medidas econômicas enraizadas no culto ao transporte individual matam – é o que garantem especialistas em saúde e meio ambiente.

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Câncer de pulmão, enfarte do miocárdio, crises agudas de asma e conjuntivite são algumas das doenças adquiridas por quem fica muito tempo no trânsito. A constatação faz parte do estudo de Paulo Saldiva, médico e professor da Universidade de São Paulo (USP), que também dá conta de que sete mil pessoas morrem de complicações ocasionadas pela poluição do tráfego, por ano, na capital paulista.
“Os estudos de condições climáticas acontecem na USP desde os anos 80. Só que, com a evolução da cidade, os níveis de especificação da poluição também se elevaram nos apresentando uma nova fonte de poluição: o trânsito”, explica.
Saldiva alerta para as doenças silenciosas trazidas pelos congestionamentos e lastima que os usuários do transporte individual percam quatro horas do seu dia no trânsito, ainda que reconheça que as alternativas de transporte não são tão bem vindas. “Eu uso bicicleta, mas o problema é que a cidade não é amigável para essa e outras formas de transporte”, denuncia.
Saldiva falou, também, dos prejuízos causados pelo inchaço na frota de transportes individuais e problemas na oferta de transporte coletivo. “O índice de poluição vem caindo, mas não podemos nos enganar. O veículo de hoje emite muito menos poluentes”, afirma, mas acrescenta que “o problema é que a tecnologia está chegando ao limite e a condição de mobilidade é muito ruim. Em São Paulo, essa melhora deixou de ser eficiente já em 2005. Nós apostávamos na tecnologia como solução, mas é só analisarmos um carro que existia em 1980 e continua existindo hoje, como o Gol”.
A opinião de Saldiva é compartilhada pelo especialista em trânsito e diretor da Perkons, José Mario de Andrade. “Não há mais tempo para discutir, é preciso agir e lançar mão de medidas restritivas como uma alternativa. É ilusão imaginar que a maioria vá abrir mão do seu carro por um bem maior sem nenhum tipo de estímulo. Porém, só a tecnologia não dá conta. Ao mesmo tempo, é preciso boa vontade dos governos com relação ao investimento em transportes coletivos de qualidade. Inclusive essas medidas restritivas, que oneram o transporte individual, precisam ser revertidas no coletivo”, diz Andrade.

Trânsito, meio ambiente e saúde

São Paulo tem 7 milhões de carros, com 11 milhões de habitantes. Os dados e o exemplo da capital paulistana são utilizados por Estanislau Maria, coordenador de conteúdo do Instituto Akatu, que trabalha em projetos voltados ao consumo consciente, para explicar que “nas metrópoles, o principal gerador de gases de Efeito Estufa é o trânsito e, depois, o lixo.”
Estanislau afirma que é preciso voltar no tempo para compreender a cultura do carro no país. “Desde os anos 50, o brasileiro prioriza o transporte motorizado e individual. Sucateamos nossas ferrovias e não temos navegação de cabotagem no Brasil. Ou seja, usamos estradas, ao invés de explorar o potencial pluvial”, analisa.
Para o médico Paulo Saldiva será preciso mais que educação para reverter essa cultura. “O que vai funcionar para o trânsito é o caos, e não só as campanhas educativas. Eu vejo muito mais motoristas mudando o comportamento depois de passarem pela UTI. Sinceramente, o único programa de reciclagem que funciona em São Paulo é o de transplante de órgãos”, diz.
No contexto mais amplo dessa fotografia está a relação entre meio ambiente e saúde. É evidente a queda da qualidade de vida nos centros urbanos, a poluição do ar, os níveis de tensão aumentando a pressão arterial, entre outros sintomas. Mas essas paisagens quase imperceptíveis ficam mais claras quando é constatado que o trânsito, hoje, é a segunda maior fonte de poluição do meio ambiente brasileiro, só ficando atrás do desmatamento da Amazônia.
Sobre a opção pelo uso do carro ou moto, Estanislau explica que a população já sofre as consequências dessa escolha. “Já estamos sofrendo as consequências. Invernos e verões cada vez mais rigorosos, o que influencia a produção dos alimentos, e assim por diante. É o conceito de interdependência: cada carro que entra em circulação gera o impacto no cenário amplo”, explica.

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A interdependência, segundo Estanislau, vai muito além dos problemas visíveis. O especialista diz que o aquecimento da economia e o estímulo do governo na compra de carros populares têm uma grande parcela de responsabilidade na questão. “Quem planeja comprar um carro não quer ouvir argumentação sobre os impactos ao meio ambiente. ‘Quer dizer que agora que chegou a minha vez e vocês estão dizendo que eu não posso comprar carro?! É, de fato ilógico”, afirma. “A situação fica mais crítica quando analisamos os dados da FGV de que o governo incluiu 3,6 milhões de pessoas na classe C entre 2010 e 2011”, esclarece.
Quando questionado sobre o resultado desta equação, Estanislau é categórico. “Vamos ficar parados no meio das ruas, se não investirmos em transporte público. Mas isso depende de política pública. Não há alternativa. Todas as medidas de sustentabilidade não são apenas morais. Perdemos vidas, tempo e produção, além da disputa do espaço público. Quanto mais carros, maior a demanda da construção das vias, que gera o caos urbano. É tudo um grande bumerangue”, finaliza.

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